Ontem, depois de almoço, desloquei-me à freguesia de Duas Igrejas em Paredes, para passar na casa de um senhor com vista à compra de um pequeno corta-relva elétrico, para ser usado num canteiro de graminha que os meus pais têm. O meu corta-relva é demasiado grande para contornar algumas plantas, e depois também não é prático andar a metê-lo na mala do carro todas as semanas. E cortar à relva à tesoura não é fazível porque os meus pais já não têm saúde para andarem vergados a fazer esse tipo de trabalho, e por isso mesmo agora sou eu que trato de lhes cortar a relva, e este aparelho semi-novo era mesmo o ideal.
Chegado à casa do senhor, que já está reformado, este recebe-me cheio de boa disposição, vestindo de camisola alusiva ao Futebol Clube do Porto e depois de ter prendido um cão preto de grande porte.
Ainda cá fora no passeio em frente do portão disse-lhe: "estes eucaliptos não podem estar aqui"!
Foi algo que, de imediato, me chamou a atenção. Enormes eucaliptos estavam a dois metros do muro da casa dele, com ramos já dentro dos limites do terreno. E os perigos são vários, desde um incêndio, que irá colocar a casa em perigo, a um eucalipto que possa deixar cair um grande ramo, ou até possa até mesmo cair por cima da casa (como já aconteceu aqui no meu concelho) e danifique a casa, ou pior, atingir alguma pessoa.
Mas o que o senhor me disse, é que já há quatro anos anda numa luta constante, com a proteção civíl e a câmara municipal, mas ninguém faz absolutamente nada, até porque o dono do terreno será pessoa influente na terra.
"Aqui ainda impera o caciquismo, e sabe que os móveis são feitos aqui, é normal que as pessoas estejam cheias de serrim dentro da cabeça", disse-me.
A lei, de 2006, há muito que é clara, e diz que matos e árvores têm de ser limpos pelos proprietários num raio de cinquenta metros em torno das casas.
"Ao abrigo no disposto no Decreto-lei n.º 124/2006, de 28 de Junho, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-lei n.º 17/2009, de 14 de Janeiro, compete aos proprietários, arrendatários, usufrutuários, ou entidades que a qualquer título detenham esses terrenos a execução das operações de limpeza até ao dia 15 de Abril de cada ano. O não cumprimento destas acções de limpeza, são passíveis de aplicação de coimas que poderão ir dos 140,00 € aos 5.000,00 €, no caso de pessoas singulares, e de 800,00€ aos 60.000,00€ no caso de pessoas colectivas".
Mas então se a lei é tão clara, e supostamente deveria estar do nosso lado, por que é que as pessoas como este senhor, tantas voltas tem dado e o que sente é que estão contra ele, como se quem estivesse a fazer algo de errado fosse ele? Vivemos numa República das Bananas em que cada um faz o que lhe apetece, e que só se faz alguma coisa quando acontece uma tragédia? Infelizmente sim.
Para mim é incompreensível que ardam casas, o bem mais precioso das pessoas. Vivemos num país cheio de leis, muitas vezes até me parece que temos é leis a mais. Só que o problema é que todos se estão a borrifar para as leis. Ninguém as cumpre, nem os cidadãos, muito menos as autoridades estão empenhadas em fazê-las cumprir. Dá trabalho e talvez achem que não dá votos andar chatear as pessoas para cumprir a lei.
E se é verdade que muitas vezes as casas ardem por incúria das pessoas, por irresponsabilidade e preguiça, pois deixam os matos quase entrar porta adentro, noutros casos, infelizmente como aqui retrato, são as próprias autoridades que fecham os olhos, porque a pessoa em causa até será influente (se calhar ligada à política) e lavam as mãos como Judas, contribuindo para a falta de segurança de todos.
As matas e tapadas neste país não se limpam porque são de gente, por norma rica e influente. Se fossem de gente pobre e prejudicasse as gentes ricas, pois não tenham dúvidas que nem um só incêndio ocorreria em Portugal. Mas se os governos e a Assembleia da República fez essas leis de limpeza e manutenção dos terrenos para prevenir os incêndios e elas não são cumpridas, então essa responsabilidade é do poder local que conhece bem as situações de perto. Essa responsabilidade é das Juntas de Freguesia e das Câmaras Municipais, que depois na prática, como se vê aqui, depois nada fazem.
E eu pergunto: se aquela estrada de Pedrógão Grande, em que morreram dezenas de pessoas dentro dos carros, estivesse, como manda a lei, limpa, numa área nunca inferior a dez metros em cada faixa de rodagem, quantas vidas se teriam poupado? Provavelmente todas.
O incêndio destruiu ainda cerca de 200 habitações. Se os terrenos estivessem limpos, como manda a lei, cinquenta metros em tornos das casas, quantas é que teriam ardido? Nenhuma. E então, de quem foi a culpa? Por que é que as casas ardem em Portugal?
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