Entrevista bastante interessante de Uma Sanchis a Zoë Schlanger para o jornal espanhol La Vanguardia.
“Cada pensamento que tens é possível graças às plantas”
34 anos. Vivo em Nova Iorque. Daqui a um mês vou casar-me com a minha esposa. Trabalho na revista The Atlantic. Escrevo sobre ambiente e ciências biológicas. A Terra é o requisito fundamental para todas as nossas vidas, e isso está acima de qualquer disputa política. A minha crença é científica: a interconexão.
Tudo começou com as plantas?
Sim, as plantas surgiram da água há cerca de 500 milhões de anos, arrastaram-se até à terra firme e trouxeram consigo a capacidade de transformar uma atmosfera irrespirável. Encheram-na de oxigénio.
Sem isso não teríamos começado a evoluir.
As plantas são a base de toda a nossa herança evolutiva. E produzem até à última partícula de açúcar que consumimos.
Elas moldam-nos?
Todos os nossos músculos, ossos e órgãos são formados por essas moléculas que as plantas sintetizam a partir do ar, da água e da luz solar. Portanto, devemos toda a nossa existência às plantas.
Sem elas desapareceríamos?
Muito rapidamente. O nosso cérebro funciona principalmente com o açúcar proveniente das plantas. Portanto, cada pensamento que tens é possível graças às plantas.
As plantas são inteligentes?
A inteligência, no seu sentido mais básico, é a capacidade de tomar decisões, planear o futuro e perceber o que se passa à tua volta para poderes prosperar.
E as plantas fazem tudo isso?
Sim. Têm estruturas familiares, conservam memórias que utilizam para tomar decisões. Algumas conseguem contar, e parecem até ser capazes de ouvir à sua maneira.
Como é a sua memória?
Uma flor dos Andes da família das Loasaceae é capaz de levantar os seus estames cheios de pólen exatamente no momento em que espera a chegada de um polinizador. E reavalia constantemente quantos polinizadores há na zona e com que frequência a visitam.
Também pedem ajuda.
As plantas costumam recorrer a outros seres vivos para fazer algo que não conseguem fazer sozinhas. Usam insectos para se livrarem de pragas. As plantas de tomate, por exemplo, conseguem atrair vespas parasitóides que eliminam as lagartas que as devoram.
Como chamam as vespas?
Graças à sua capacidade de sintetizar compostos químicos complexos consoante o que se passa à sua volta, que segregam através dos poros das folhas.
Com esses compostos influenciam o comportamento de outros seres?
Sim, e também utilizam esses gases para avisar outras plantas de um ataque iminente. As plantas produzem milhares desses semioquímicos nos seus corpos.
Pensamos que as plantas são passivas.
Porque estão fixas num só lugar. Mas aquilo que lhes falta em mobilidade, compensam recorrendo a outros animais. Têm estas relações mútuas que elas próprias desenham.
As plantas sentem, sofrem?
Não há nada que sugira que as plantas tenham recetores de dor, mas reagem com uma capacidade defensiva incrível quando são danificadas.
A senhora beliscou uma planta.
Sim. Fui ao laboratório de Simon Gilroy em Wisconsin e belisquei plantas mutantes concebidas para brilhar quando eram atacadas. Gilroy estava a estudar a forma como o sinal desse ataque se propaga pela planta.
E então?
Como é possível que algo sem cérebro nem sistema nervoso consiga responder com todo o corpo a um ataque localizado? Pesquisas como esta estão a levar neurobiólogos a questionar se não será altura de alargar o conceito de sistema nervoso.
Criaturas sem cérebro.
Isso levanta questões muito interessantes sobre a ideia de inteligência em rede. A sua capacidade de perceber o mundo está distribuída por todas as partes do seu corpo.
Sem comunicação, uma floresta é uma floresta?
As árvores comunicam entre si a longas distâncias. A comunicação é fundamental na vida das plantas, para trocarem nutrientes e interagirem com o ambiente. Sem isso, uma floresta é uma casca vazia.
As plantas ouvem?
Percebem vibrações acústicas. A onagra, por exemplo, consegue adoçar o seu néctar três vezes mais em resposta à simples reprodução do som do voo das abelhas.
Há quem afirme que as plantas têm consciência.
Sabemos que as raízes das plantas distinguem entre o próprio e o alheio e que conseguem coordenar-se com outras plantas sem perderem o sentido de individualidade.
É o grande debate da botânica.
Mas aquilo que ninguém discute é se as plantas são ou não seres incríveis — muito mais activos, espontâneos e vibrantes do que alguma vez lhes reconhecemos.
Isso mudaria tudo.
Se tomássemos consciência de que as plantas são sensíveis, activas e capazes de tomar decisões, mostraríamos muito mais humildade perante esta forma de vida que torna possível todo o nosso mundo.
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