domingo, 10 de março de 2024

Granizo na Cycca

Janeiro e fevereiro foram os meses mais quentes de sempre. Março entrou chuvoso e frio e pintou de branco os cenários habituais como a Serra da Estrela. Aqui pela terrinha as temperaturas máximas andam pelos 13º e, de vez em quando, cai uma tromba de água ou saraivada, como se vê aqui pelo gelo acumulado na cyca. 


domingo, 3 de março de 2024

Agricultores que Não Compram o Discurso Anti-Ambiental

"A criadora de gado Laura Martínez, de 31 anos, tem comparecido às manifestações de protesto com os seus colegas do campo porque partilha muitas das reivindicações, mas não aquelas que visam relaxar as medidas ambientais que afetam as explorações agropecuárias. "Não faz sentido falar em remover a Agenda 2030 [acordo das Nações Unidas sobre desenvolvimento sustentável] ou em não reduzir o uso de pesticidas. Dependemos do ecossistema e se o destruirmos, não sei como vamos sobreviver", afirma. 

Com ela, outros agricultores consideram um erro atribuir os problemas que o setor enfrenta às exigências ambientais impostas pela Europa para aceder aos apoios da PAC (Política Agrícola Comum). Ou responsabilizar o Pacto Verde, a estratégia da UE para alcançar a neutralidade climática em 2050, que estava prevista para o futuro e que visava reduzir para metade o uso de pesticidas, herbicidas, inseticidas..., um ponto que foi interrompido. Outra questão, alertam, é a forma como Bruxelas pretende implementar estes requisitos, o que pode levar ao desaparecimento das pequenas explorações devido à sua incapacidade para se adaptarem às mudanças.

Antonio Feliu, um agricultor maiorquino de 55 anos, também foi visto nas concentrações de protesto, "porque as pessoas do campo vivem mal" e devido à concorrência desleal e à excessiva burocracia com que se deparam. Mas, ao mesmo tempo, defende que o caminho a seguir é o da agricultura sustentável, que pratica na sua exploração agropecuária, composta por várias quintas que totalizam 100 hectares (o tamanho médio de uma exploração em Espanha ronda as 44 hectares, indica o Ministério da Agricultura). Nestas, cultiva frutas em modo biológico e cria vacas, porcos, cabras, ovelhas, galinhas e coelhos, que vende a particulares, cooperativas, restaurantes ou grossistas.

A de Feliu é uma das 914.871 explorações agrícolas que existiam em Espanha em 2020, menos 7,6% do que o censo de 2009, das quais cerca de 650.000 recebem prestações económicas da PAC, indica o último censo agrário publicado há dois anos.

A Feliu agrada-lhe "ter o campo bem cultivado, sem porcarias nem herbicidas. Não quero contaminar a água que vamos beber, nem a planta que depois vendemos, não é a minha filosofia de vida". Com este caminho traçado, assegura que "as medidas ambientais da PAC não podem ser suavizadas porque são insuficientes". Embora acrescente imediatamente: "Dizem que a PAC é sustentável e isso não é totalmente verdadeiro porque apostam nos grandes proprietários e na produção intensiva".


Mas a pressão das manifestações de tratores está a surtir efeito e a Europa está a ceder terreno na agenda verde. Bruxelas está a estudar tornar voluntárias 4 das 10 práticas contempladas nas Boas Condições Agrárias e Ambientais (BCAM), indispensáveis para receber os apoios da PAC, que afetam a rotação de cultivos, a manutenção dos solos ou a superfície que deve ser deixada em pousio. "Quase 55% das explorações ficariam isentas dessa condicionalidade", apontou o ministro da Agricultura, Luis Planas, após a última reunião com as principais organizações do setor, na quarta-feira.

O principal problema são os acordos de livre comércio e de concorrência desleal de outros produtos externos, mas estas protestos não devem ser silenciadas através da revogação das mínimas normas ambientais existentes", explica Helena Moreno, responsável pela agricultura da Greenpeace.

Um retrocesso que também é denunciado pela coligação Por uma PAC Alternativa, formada por criadores de gado, agricultores e ONGs ambientalistas, entre outros. "Se isto continuar assim, a PAC mais verde da história [da atual de 2023 a 2027] nem sequer chegará às obrigações de 2014", afirmam. Naquela altura, contemplava-se a manutenção de pastagens permanentes, a diversificação de culturas, o incentivo a espaços para proteger solos e a preservação da fauna selvagem que poliniza e combate pragas.

A PAC apenas exige manter sem produção 4% da superfície agrícola

As consequências

A preocupação ambiental não é exclusiva dos agricultores que cultivam de forma biológica. É o caso de Santiago Pérez, de 52 anos, que explora 60 hectares no Campo de Cartagena (Murcia), onde produz duas colheitas (alface e batata), conforme permitido pela legislação local. A experiência ensinou-lhe que "hoje estamos a sofrer as consequências das más práticas agrícolas porque se introduziu muito nitrogénio no solo".

Neste caso, as sequelas tornaram-se visíveis no mar Menor, que perdeu o seu equilíbrio e sofreu duas crises com milhares de peixes mortos devido, principalmente, à acumulação de nitratos usados como fertilizantes.

Utilizar os mínimos fitossanitários "é o melhor para o manejo do produto e para vender qualidade", assegura o agricultor que exporta parte da sua produção. Cerca de 15 dias antes da colheita, Pérez não aplica substâncias químicas, o que evita a sua presença. Também mantém quase metade do seu terreno em pousio com o objetivo de recuperar a terra. O descanso do solo é uma das medidas que a PAC considerava obrigatória e que foi reduzida. Agora, os agricultores só precisam de manter 4% da sua superfície agrícola sem produção, em vez dos anteriores 7%.

Pérez está habituado à carga burocrática, um dos aspetos mais criticados pelos agricultores que pedem à Europa uma simplificação administrativa. Ele não solicita a PAC, mas apresenta um relatório de controlo à Confederação Hidrográfica do Segura (CHS) e outro à comunidade autónoma. Neles, indica a quantidade de água utilizada, as culturas cultivadas, o fertilizante aplicado... "São praticamente iguais, estamos a duplicar papéis", alerta. Além disso, possui um livro digital onde os seus clientes podem consultar a rastreabilidade da "alface que acabaram de receber". Pérez entende que para uma exploração pequena é demasiada burocracia.

Agricultores que no compran el discurso antiambiental | E. Sánchez / S. Castro | El País | 3 de Março de 2024

domingo, 25 de fevereiro de 2024

Euphorbia: do Vaso para a Terra

Esta minha Euphorbia trigona rubra que tinha neste vaso alto junto à garagem estavam muito grande e era evidente para mim que as raízes já tinham tomado conta da terra toda. Decidi então que tinha de retirar o cato dali e transplantá-lo para outro sítio. Tombei o vaso e facilmente consegui retirar um torrão direitinho. 

Coloquei a planta no carro de mão e levei-o para o outro lado da casa, do lado do vizinho para colocar nessa pequena faixa de terreno, entre o lilaseiro e outro cato que já lá estava e onde estão também a cyca e o feto arboreo. 

O cato é bastante frágil e, no transporte acabaram por se partir duas pontas dos canos maiores, que guardei e coloquei num vaso. Tratei de abrir a cova e colocar lá o cato, e arranjei também umas estacas que fui buscar ao monte para servir de tutores. 

Bom, não foi tudo perfeito, mas foi o possível atendendo a dimensão e a fragilidade da planta. Ficou no sítio, agora basta esperar que comece a agarra-se à terra e a puxar novos rebentos. 

O pior foi no dia seguinte! Acordo, vejo-me ao espelho, e tinha a cara do lado esquerdo toda vermelha bem como o próprio olho esquerdo todo vermelho. O que é que aconteceu? O problema foi o cato ter partido as pontas e começado a segregar aquela substância branca leitosa e eu ter andado a fazer o trabalho sem luvas e sem cuidado nenhum! Portanto, já sabem, cuidadinhos com os catos porque o problema não são só os picos!




Uma Bela Poda no Azevinho variegata



Mais uma vez esqueci-me do antes. Quando tirei as primeiras fotografias já tinha dado um grande desbaste no azevinho variegata e bastava aparar a parte mais alta. Foi no início do mês que num fim de semana ocupei-me desta tarefa. Comecei por podar por baixo e depois fui subindo. Não está completamente perfeito mas acho que não ficou muito mal. Optei por manter esta estética cónica natural. Com o desbaste há ali uma zona que ficou despida de folhas, e reparei até que havia muitas pontas secas. Espero que depois da poda ele possa regenerar e as folhas voltem a aparecer. 

sábado, 10 de fevereiro de 2024

O Grande Polinizador Contra-ataca

Ainda recentemente deixei aqui artigos alarmantes sobre as consequências da queda abrupta dos polinizadores. Agora resolvi partilhar aqui a experiência de Monty Don publicada no último número da revista Gardeners' World:



"Ainda não é demasiado tarde. Algo que todos nós podemos fazer é tornar os nossos jardins, por mais pequenos que sejam, num refúgio para a vida selvagem de todos os tipos.

Se és um inseto em busca de alimento, Longmeadow parece ser o local ideal. E isso, para além de quaisquer elogios dos espetadores, visitantes ou especialistas, é a melhor medida do nosso jardim.

Adoro ouvir as abelhas enquanto ávidas fazem o seu trabalho, recolhendo pólen e néctar. As colmeias estão no pomar, para que as abelhas não tenham que viajar muito para encontrar comida, mas há centenas - não, milhares - de diferentes tipos de insetos por todo o jardim, alimentando-se ativamente e polinizando as minhas plantas.

Não é apenas bonito de se ver - proporciona-me a mim e à minha família um prazer ilimitado, que sei que muitos de vocês partilham. Mas isso é nada comparado com o som de todos esses insetos ocupados a fazer o seu trabalho salvador de vidas.

Não são apenas as suas vidas que estão a salvar - embora esteja certo de que, se a consciência fizesse parte da sua composição, estariam focados exclusivamente na sua própria existência. Mas, como os estudos têm demonstrado, as nossas populações de insetos estão desesperadamente reduzidas.

De volta à vida.

A agricultura tem passado os últimos 75 anos ou mais focada na produção máxima e no lucro à custa do ambiente. Os nossos quintais estão a tornar-se no último bastião para demasiadas criaturas. Nem todas estas criaturas são glamorosas, mas cada uma é importante. Estamos a chegar a um ponto de crise e nós (ou seja, tu, eu, cada um de nós) temos de assumir este problema e ser parte da solução. Porque, para além de desejar uma gama tão diversificada de vida neste planeta quanto possível, não teremos os cultivos alimentares de que os humanos precisam para sobreviver sem estes insetos polinizadores. É tão simples e crítico como isso.

Isto não acontecerá da noite para o dia. Não verás as prateleiras dos supermercados vazias de repente na próxima semana porque a população de abelhas na Califórnia se tornou perigosamente baixa - o que aconteceu. Mas estas coisas avançam e acumulam-se até se tornarem numa crise, quando todos dizem "algo tem de ser feito" - e aí já é tarde demais.

Mas ainda não é tarde demais. Algo que todos podemos fazer é tornar os nossos jardins, por mais pequenos que sejam, um refúgio para a vida selvagem de todos os tipos. É fácil e bonito e garante que o teu jardim será muito, muito mais saudável como resultado.

Penso que é um erro focar-se demasiado estreitamente num grupo específico de criaturas selvagens preferidas, sejam abelhas, ouriços, tritões ou pássaros. A natureza não funciona assim e nem o teu jardim. Tudo está ligado e, ao abraçar o equilíbrio da natureza, podes beneficiar tudo simultaneamente.

Passei as últimas três décadas em Longmeadow a tentar fornecer as melhores condições para que esse equilíbrio se estabeleça e floresça face a todas as estações, climas e circunstâncias. Algumas dessas foram específicas e o resto mais um conjunto de atitudes e abordagens sobre como gerir e cuidar do jardim. O específico inclui áreas como o Jardim da Vida Selvagem (a pista está no nome), que eu deliberadamente permito que se torne o mais "selvagem" possível sem perder o que considero ser o seu charme hortícola. Estas coisas são subjetivas, mas criei-o para ser um refúgio interno no coração do que já é um jardim muito amigo da vida selvagem.

Também foi criado para fornecer uma boa fonte de néctar para as duas colmeias que adquiri, cada uma com 10.000 abelhas, que agora residem em duas colmeias no pomar. Do amanhecer ao anoitecer, há uma constante procissão de abelhas saindo para forragear no jardim e outras retornando carregadas de néctar. Fui orientado nisso por um apicultor local sábio e encantador, que me vai supervisionar durante o próximo ano ou mais, até que eu tenha aprendido o básico da apicultura.

O plantio para as abelhas baseia-se no conhecimento de que as abelhas sempre vão preferir um suprimento de néctar antes de passarem para outra fonte. As abelhas são ávidas e obcecadas. Elas vão se banquetear quase exclusivamente numa flor escolhida - como a flor de maçã - antes que ela desapareça por um ano e elas mudem. Portanto, plantas com um longo período de floração e uma sucessão de flores são melhores para elas do que uma colheita curta e espetacular. Estas são frequentemente simples e muito comuns - margaridas, centáureas e todas as formas de escabiosa são firmes preferidas das abelhas.

"Monty on planting for pollinators" | Gardeners’ World | Janeiro 2024

Os Agricultores Vão Continuar a Matar-nos e a Matar os Polinizadores

 Os agricultores europeus, organizados pela extrema-direita de Viktor Órban, andaram semanas a manifestar-se. Entretanto os portugueses, que nunca se tinham queixado de nada, decidiram, precisamente agora, que estamos sem parlamento e com um governo de gestão e sem capacidade ou até legitimidade negocial, de se manifestar também e mostrando assim assim a sua face.

E entretanto a UE, para que os meninos agricultores fascistas não fiquem zangados, resolveu voltar com a palavra atrás e, depois dos partidos de direita terem conseguido prolongar por mais dez anos a utilização do glifosato (herbicida) coloca-se agora um travão no uso sustentável dos pesticidas. 

Se cedemos às exigências da extrema-direita, estamos a ser governados pela extrema-direita. Esta não é, definitivamente, a minha União Europeia. 


terça-feira, 30 de janeiro de 2024

Aeonium Old Pompeu House

 Por estes dias passei na "Antiga Casa Pompeu", em Gaia, ali junto da N222, onde lá podemos ir entregar material reciclável (cartão e plástico). Quando estava quase a sair algo chamou-me a atenção. Uma flor grande e amarela fazia-se de uma suculenta. Parei a carrinha e fui lá, de telemóvel em riste investigar melhor. Era um aeonium comum, mas a flor, bem bonita. 



segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

Quais as Consequências das Altas Temperaturas no Inverno nas Plantas?

Neste momento em que escrevo estamos no fim do mês de janeiro e eu posso dizer que neste inverno ainda não vi geada. Neste última semana de pleno inverno, chegamos ao cúmulo de termos em Portugal temperaturas acima dos 20ºC, mais ou menos as mesmas temperaturas que fazia no Rio de Janeiro que está no pico do verão. E lembrar que, por exemplo, o sul de Espanha teve, no final do ano, temperaturas a rondar os 30º e era ver os espanhóis, em altura do Natal, a correr para as praias. 

Ainda que muitos, muitas vezes motivados por questões ideológicas, o neguem, a verdade é que o clima está a mudar, e muito rapidamente e lembrar também a questão da falta de água que já se coloca, tanto em Espanha, como no Algarve. 

E quais as consequências destas mudanças radicais no clima para as plantas? É isso que podemos ficar a saber neste artigo do El País, publicado hoje.


"As altas temperaturas alteram os ritmos de muitas plantas, que, face a outonos e invernos amenos, florescem mais cedo e até podem fazê-lo duas vezes. Este janeiro, Javier Cano, chefe do instituto meteorológico de Getafe da Aemet, deparou-se pela primeira vez, em 44 anos de observações ininterruptas na Comunidade de Madrid, com algum exemplar de amendoeira ainda em flor e com folhas verdes da temporada passada, que deveriam ter desaparecido no final do outono ou início do inverno. "É uma anomalia que nunca tinha visto e pode dever-se à escassez de geadas, necessárias para que a árvore se desfaça dessas folhas", explica. Além disso, as primeiras flores surgiram 16 dias antes de 7 de fevereiro, a data média de início da floração, tomando como referência as últimas três décadas.

Os dados de Cano confirmam que este adiantamento nas amendoeiras do sul e centro de Madrid, uma das espécies que floresce mais cedo, tornou-se uma tendência: em quatro décadas, as pétalas aparecem cinco dias antes. As alterações na floração são detetadas há anos em diferentes espécies.

A Catalunha é um exemplo claro. As temperaturas de setembro e outubro do ano passado, muito mais quentes do que o habitual, transformaram o outono numa segunda primavera, indica o Centro público de Investigação Ecológica e Aplicações Florestais (CREAF). As plantas decidiram regressar ao traje primaveril: a vinha do Penedès e o Garraf rebrotaram, a queda das folhas das árvores caducifólias atrasou-se e várias plantas selvagens e árvores frutíferas floresceram pela segunda vez, desde as Terres de l'Ebre até à Catalunha Norte.

Em 2022, a voragem foi semelhante e as roseiras de montanha das zonas interiores da Catalunha floresceram quatro ou cinco meses antes do habitual, um facto inédito, que foi registado por voluntários do observatório RitmeNatura, uma iniciativa de ciência cidadã gerida pelo CREAF e pelo Servei Meteorològic de Catalunya. "Mesmo", destaca o CREAF, "chegaram a produzir fruto pela segunda e até terceira vez, árvores como a pereira ou a cerejeira". Ainda não foram estudados os efeitos do atual episódio de calor em Espanha, onde foram batidos 68 recordes de temperaturas.

Não são anomalias inócuas, adverte Ester Prat, coordenadora do RitmeNatura. "Embora as segundas florações sejam mais discretas, a planta precisa de água e pode representar a despesa de recursos que necessitará na primavera", adverte. Também pode acontecer que as flores se abram antes de aparecerem os insetos, "o que afetaria a produção de frutos pela falta de polinização, em última análise, a sobrevivência da espécie", acrescenta Joan Pino, diretor do CREAF. E o perigo das temidas geadas tardias acentua-se, pois podem causar danos maiores do que em décadas anteriores, quando as plantas sofriam, mas não com tanta intensidade por não acordarem antes do tempo do seu retiro invernal.

Andrés Bravo, investigador do Museu Nacional de Ciências Naturais, dependente do Conselho Superior de Investigação Científica (CSIC), destaca a necessidade de investigar em profundidade os efeitos das altas temperaturas invernais, às quais não tem sido dada tanta atenção quanto às temperaturas de verão por serem menos comuns. "Estas perturbações respondem a fatores globais e devem ser analisadas em conjunto", comenta.

Crescimento

Ele exemplifica com a afetação ao crescimento de uma árvore. "Se não chover no inverno nem na primavera e a temperatura estiver acima do normal, pode ocorrer um colapso no seu crescimento e, muito provavelmente, aumentará a mortalidade", acredita Bravo. É uma combinação de calor e falta de precipitação; "se isso acontecer, é catastrófico para o seu desenvolvimento e, se a isso se acrescentar uma geada tardia, o problema amplifica-se".

Bravo acrescenta que é o momento de "considerar uma gestão das florestas que permita reduzir a competição por água com espécies mais bem adaptadas quando são realizadas repovoamentos". Porque esses períodos de calor no inverno serão cada vez mais frequentes, e são episódios que evidenciam o problema. "São muito chamativos; as pessoas percebem mais que algo está errado se no inverno houver temperaturas altas, porque se estivesse frio, mas não chovesse, a perceção não seria a mesma", sugere.

A situação gera grande preocupação nas explorações agrícolas. O grupo de pesquisa do Centro de Investigaciones Científicas y Tecnológicas de Extremadura trabalha na biologia reprodutiva e nas necessidades de frio das árvores frutíferas. María Engracia Guerrero, membro da equipa, explica que estão a desenvolver "vários projetos, porque os invernos são um pouco mais amenos e árvores que floresciam perfeitamente há 20 anos agora têm problemas, pois cada espécie precisa de alguns dias de frio que agora não tem, e algumas flores não dão fruto", detalha.

Quando as folhas das árvores frutíferas caem, a árvore entra em repouso e acumula reservas, ao mesmo tempo que o botão se forma, algo impercetível do exterior. Para isso, precisam de algumas horas de frio e, em seguida, calor, e quando esse ciclo se completa, revivem e florescem. No entanto, atualmente, "o calor é fácil de alcançar, mas o frio não".

Os investigadores fazem projeções para o futuro, a 50 e 80 anos, estudam os genes relacionados com essa necessidade de temperaturas baixas e as variedades que são geneticamente compatíveis. "Em algumas, como a cerejeira, sabemos qual é o gene", esclarece. O objetivo é que os agricultores saibam que variedade devem escolher. Existem algumas, como o ameixeira japonesa, que foram cultivadas tradicionalmente e "que não poderão ser plantadas daqui a 50 anos se não forem substituídas por uma variedade que precise de acumular menos frio para florescer adequadamente".

Um dos futuros mais sombrios paira sobre as plantas de alta montanha, afirma Pablo Vargas, investigador do Jardim Botânico de Madrid (CSIC). "São os melhores bioindicadores das mudanças climáticas, especialmente as das cimas mediterrâneas que já se encontram muito mal", sustenta. A fuga mais rápida para uma planta, que não tem tempo para evoluir e adaptar-se às novas condições, é migrar para áreas de clima semelhante. No entanto, não têm tarefa fácil, pois os habitats adequados diminuem, não há mais espaço para subir. Isso acontece, por exemplo, em Sierra Nevada (Granada), com a espuela (Linaria glacialis) e a amapola de Sierra Nevada (Papaver lapeyrousianum). "A outra opção de uma planta assediada é resistir, pôr em prática a sua capacidade de resistência, como acontece com a azinheira ou o azevinho (azeitona silvestre), mas isso depende não apenas da espécie em questão, mas dos indivíduos", esclarece.

"Este calor inusual desorienta a las plantas" | Esther Sánchez | El País (29 de janeiro de 2024)

domingo, 28 de janeiro de 2024

Um Mundo Sem Flores

Artigo publicado hoje, no El País, sobre as trágicas consequências da diminuição dos polinizadores.


O planeta está a ficar sem polinizadores. O colapso pode ser pior entre os zangões do que nas abelhas. Sem eles, quem polinizará as plantas que precisam deles para a sua fecundação? Bem, elas próprias. A taxa de autofecundação de uma planta silvestre aumentou em quase 30%. E se já não precisam de os atrair, para que servem as flores e o néctar? Ambos os atributos do pensamento selvagem (Viola arvensis) diminuíram quando comparados com exemplares de há 30 anos. É apenas uma espécie entre milhares, e apenas foi observado em França, mas pode estar a abrir-se caminho para um mundo sem flores.

As angiospermas, as plantas com flores, apareceram na Terra há cerca de 130 milhões de anos e demoraram apenas mais alguns a colorir o planeta. Charles Darwin, o pai da teoria da evolução, parece não ter ficado satisfeito com isso. Numa carta ao seu melhor amigo, o botânico e explorador Joseph Hooker, ele dizia: "O aparente rápido desenvolvimento de todas as plantas superiores nos últimos tempos geológicos é um mistério abominável". Nesse sucesso, as plantas encontraram aliados em insetos, aves e até dinossauros, que as ajudaram a fecundar-se umas às outras através do pólen, os gametófitos masculinos. Hoje, 80% das espécies vegetais silvestres e 70% das cultivadas dependem, em maior ou menor grau, dos polinizadores. Por isso, o declínio das populações e espécies inteiras de insetos, reduzidas para metade nas zonas mais afetadas pelos humanos, pode ter um impacto enorme na flora mundial.

Na região de Paris, os botânicos observaram o que poderia acontecer no resto do planeta. Nos últimos anos, as flores de pensamento selvagem tornaram-se menos vistosas. Ao mesmo tempo, parecia evidente a redução das populações de insetos polinizadores. Para verificar se ambos os fenómenos estavam relacionados, recorreram ao que chamam de ecologia da ressurreição. Samson Acoca-Pidolle, investigador da Universidade de Montpellier, explica o que é: "Consiste em utilizar a propriedade de latência de alguma fase da vida para armazenar indivíduos durante um longo período. No nosso caso, algumas sementes recolhidas entre os anos noventa e 2000 e armazenadas em refrigeradores dos Conservatórios Botânicos Nacionais". Em 2021, recuperaram as sementes de pensamento selvagem da sua hibernação, regressaram aos campos de onde as tinham obtido e recolheram outras para comparar.

Os resultados da sementeira, publicados na revista científica New Phytologist, são preocupantes. Levaram ambos os grupos de sementes, as ressuscitadas e as atuais, para estufas de quatro locais diferentes. Em cada local, conceberam a mesma experiência. Em áreas isoladas com tela mosquiteira, semearam cerca de trinta plântulas de cada linhagem. Em abril, introduziram colmeias de abelhões para as polinizar e colheram uma segunda geração. No total, 792 plantas foram investigadas em todos os aspetos possíveis. Analisaram o seu genoma, a frequência de visitas de insetos, taxas de crescimento vegetativo e, especialmente, todos os parâmetros da floração: comprimento da corola, largura do labelo, comprimento do esporão...

Dos sete parâmetros, apenas o comprimento dos sépalos, essa espécie de proteção sob as pétalas, era igual. No restante, tudo tinha mudado. Especificamente, as plantas atuais reduziram em 10% a sua área floral. Tinham também menos guias de néctar, padrões visuais que orientam o inseto até ao néctar e ao pólen. Um último e decisivo dado: nos quatro locais onde realizaram as experiências, a linhagem ressuscitada do passado produzia em média 20% mais néctar.

Os autores das experiências observaram mais duas tendências. Por um lado, a taxa de autofecundação das plantas atuais é 27% maior. Esta capacidade de reprodução sem a necessidade de elementos externos apresenta um problema: a redução da diversidade genética devido à endogamia torna o organismo mais vulnerável e menos flexível para enfrentar as mudanças ambientais e, naturalmente, aumenta o risco de herdar uma mutação prejudicial. Nas flores atuais, os botânicos detetaram uma menor hercogamia, a distância entre estames e pistilos, entre os órgãos sexuais masculinos e femininos, para facilitar a autofecundação.

"A autofecundação é a forma extrema de endogamia e nas plantas (e em todos os organismos) afeta o seu tamanho, a sua sobrevivência..." diz Pierre-Olivier Cheptou, investigador do Centro Nacional de Investigação Científica e supervisor do trabalho de Acoca-Pidolle. De facto, verificaram que o número de sementes produzidas pelas plantas atuais em comparação com as do passado era ligeiramente menor.

A enorme mudança deve-se à crescente dificuldade que o pensamento silvestre enfrenta ao recrutar polinizadores. O declínio destes insetos estaria tornando desnecessárias as flores e o néctar que os atraíam, elementos nos quais as plantas investem uma parte significativa dos seus recursos. "O que o nosso estudo mostra é que estão a evoluir para prescindir dos seus polinizadores", destaca Cheptou. De facto, as experiências, confirmaram que os abelhões iam em menor número e com menor frequência aos exemplares atuais.

O professor Michael Lenhard lidera um laboratório de genética dos órgãos das plantas na Universidade de Potsdam (Alemanha). Não relacionado com as experiências de pensamento silvestre, investigou o síndrome de autopolinização. Lenhard concorda que um dos resultados é a perda de atratividade destes ornamentos: "Sobretudo quando o síndrome de autofecundação já está fortemente estabelecido. Neste caso, reduzem-se dois sinais importantes para a atração dos polinizadores: o visual, o tamanho da flor, e o olfativo, o aroma. Isto faz com que as flores sejam menos chamativas e menos atrativas para os polinizadores".

Uma Mudança Rápida

Da Universidade de Zurique (Suíça), o investigador Sergio Ramos lembra que a autofecundação vegetal sempre esteve presente. "Não é um fenómeno isolado, todos os grupos de plantas já o experimentaram", aponta. Ramos realizou há alguns anos uma série de experimentos com couves, que têm flores de um amarelo intenso. Como o resto das plantas, têm de atrair insetos polinizadores, mas não podem ser demasiado atrativas, senão também atrairão insetos herbívoros. Nos seus ensaios, usaram plantas com a mesma origem que distribuíram em quatro grupos e jogaram com a presença/ausência de abelhões e/ou lagartas da borboleta da couve, um voraz herbívoro. À oitava geração, as flores de umas e outras eram muito diferentes. As expostas aos polinizadores tinham flores maiores e libertavam maior fragrância. Enquanto as que sofreram o ataque das lagartas tinham reduzido o seu atrativo floral, mas aumentado a quantidade de metabólitos tóxicos, para afastar os herbívoros.

"Foi um dos primeiros exemplos experimentais de que esta transição ocorre de maneira muito rápida", comenta Ramos. Mas há outros trabalhos que também manipularam a presença ou ausência de insetos e "o que se tem visto é que quando as plantas não têm movimento de pólen, não há cruzamento, mediado pelos insetos, logo após algumas gerações, começa a ver-se que evoluem para a autoreprodução", acrescenta. Para Ramos, o diferente agora é, novamente, a velocidade da mudança: "Esta transição tem existido naturalmente, é comum entre as plantas, mas a mudança global está a acelerá-la. A velocidade é o dramática. Os biólogos evolutivos não imaginavam poder ver estas mudanças em tempo real. Para mim, é o que acho bonito e ao mesmo tempo alarmante".

"La falta de abejorros abre la puerta a un mundo sin flores" | Miguel Ángel Criado | El País (28 Janeiro 2024)